terça-feira, 21 de agosto de 2012

FOGÃO A LENHA


 Aparecido Donizetti Hernandez
Itápolis- Itapevi / SP


Fogão a lenha

CÂMARA BRASILEIRA DE JOVENS ESCRITORES - CBJE
Em minha infância ouvi muitas histórias à beira do fogão a lenha contadas por minha avó, todas com sabedoria popular, tendo seu fundo de verdade. Histórias e fábulas que se perderam no tempo, e que ninguém sabe onde começou e quem as criou.
E assim, contou, certa vez, minha avó:
"Nos primórdios, onde a capivara ainda tinha rabo, um rabo esbelto, lindo e vistoso, sempre cuidado com muito zelo, considerando seu rabo o mais belo da fauna. E, de fato, o era.
Num belo fim de tarde de verão, onde o sol quase se pondo no horizonte e a brisa fresca e suave amenizando o calor do dia; a capivara, com seu esbelto rabo, sentou-se à beira da estrada acompanhada de seu melhor amigo, o macaco - também com seu lindo e longo rabo. Ambos à beira da estrada... larga estrada de areão, onde raramente passava viva alma. Ali sentados contavam histórias um ao outro, lembravam de fatos já passados, que juntos fizeram e colocavam em dia os assuntos vigentes da floresta.
Ali, macaco e capivara estendiam seus rabos sobre a branca areia do caminho, tranquilos e proseadores mantinham-se dessa forma. Ocorreu que nessa tarde, ao longe, se ouvia o ranger de rodas, e logo a capivara alerta seu companheiro e amigo:
- Compadre Macaco não quero deixá-lo preocupado, mas o ranger são de rodas de um carro de boi.
O macaco não deu a menor importância para o alerta da Capivara e continuava com seu longo rabo sobre a estrada de areão.
A amiga capivara não entendia porque o macaco somente continuava a contar histórias de forma empolgada e fazendo estrepolias, não dando atenção ao seu alerta.
- Compadre Macaco, já estou avistando ao longe... é mesmo um carro de boi, com oito juntas e está vindo em nossa direção, tire seu rabo da estrada.
O macaco continuava com suas estrepolias e contando suas histórias, mantendo seu longo rabo sobre a estrada.
- Compadre macaco, tire seu rabo da estrada, o carro de boi está muito próximo.
O macaco nada de tirar seu longo rabo do meio da estrada.
O carro de boi com oito juntas, carregado e rangendo suas rodas, aproxima-se mais e mais, e nada do macaco tirar seu longo rabo da estrada. A capivara continuava a se preocupar com o rabo do amigo macaco estendido sobre a estrada de areão.
- Compadre Macaco, o carro de boi está chegando e seu rabo continua na estrada.
O carro de boi chegou, o macaco recolheu seu rabo rapidamenbte e sentou-se em cima; a capivara, que estava preocupada com o rabo de seu amigo macaco, esqueceu-se que o seu esbelto e lindo rabo, que tanto admirava, também estava na estrada, e o carro de boi passou por cima, decepando-o.
Por isso hoje as capivaras não tem mais rabo.
“Quem cuida do rabo dos outros esquece seu próprio rabo".
Histórias e fábulas contadas por minha avó à beira do fogão a lenha...

domingo, 19 de agosto de 2012

MODIFICANDO A HISTÓRIA


Modificando a História
Ruthy Neves



Sonhei tanto com a vida fluindo para “o todo sempre”...
Não queria pensar em separação.
Esperei todas as noites que o sonho sonhado...
Tivesse realização.
Porém... O tempo passou...
Os caminhos se perderam...
A solidão fez morada.
O coração ficou machucado.
Com medo de amar outro alguém...
A preferência foi ficar só.
O sentimento corrói a alma...
Dói por dentro, saber que o amor apaixonado foi traído.
No entanto há esperança...
A semente do amor não morreu...
Está pronta para germinar em outros braços...
E na solidão alcançar a vitória.
Não quero ser herança de uma memória que não tem coragem...
De modificar sua história.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O ESPINHO DA ROSA

O espinho da rosa
Ruthy Neves



Casas de tábua... misturadas ao latão.
Lugar sujo e deprimente.
Lixo nas portas, nas vielas, na estrada...
lixo na linha do trem.
Pessoas sentadas, farrapos humanos...
sem esperanças, sem emoção.
Olhos sem brilho, pés no chão.
Crianças brincando no meio do lixão...
ainda criando ilusão.
Lixão de coisas imprestáveis...
não de coisas recicláveis que gente honesta,
trabalhadeira, ganha o pão.
É o desleixo das pessoas que não tem mais noção.
Lixão de vida, amantes da pedra que não faz carinho não.
A linha faz a rota de ponto a ponto, do tráfego constante...
e uso indiscriminado, que a comunidade já assimila sem fazer confusão.
Tráfego de pessoas que não tem escrúpulos até com o irmão.
Irmão de sangue, irmão de criação.
Todos são iguais com a pedra na mão.
Sem idade, sem identidade, apenas um ser que precisa de compreensão.
Doentes da alma e do corpo que não é mais são.
As autoridades colocam a venda para a situação...
deixam que se matem pela droga
ou por um que já demente perde a razão.
Cobranças do ganho fácil do dinheiro ou mercadorias,
 que no viciado, a droga o fez ladrão.
Quanto tempo mais veremos isto sem solução?
Quanto tempo mais por interesse de alguns que não tem coração,
vamos ver irmãos perdidos no lixo da vida sem salvação.
Talvez não saibamos amá-los.
Talvez não somos capazes de estender a mão.
Muitos viram a cara,
deixam a venda em seu rosto, com descaso.
Não acreditam que é doença não!
Não são grandes para o perdão.
Filhos, pais, irmãos ausentes sem morrer...
Já são considerados como dejetos sem salvação.
Lágrimas, choros em festas, que não serão mais festas,
mostrará a hipocrisia de um dia se chamarem cristãos.
Vamos movimentar a esperança.
Faze-los enxergar as rosas da vida e não a podridão.
A rosa é vida.
Vamos dar esperanças de vê-la  na próxima estação.
Vamos escrever para que isto não fique
 somente em estatística e vire lembrança.
Vamos retirar os espinhos
e mostrar-lhes que tudo tem uma solução.
É tempo de primavera. Tempo de cheirar as rosas.
A hora é agora.


quinta-feira, 21 de junho de 2012

DEPOIS QUE VOCÊ SE FOI




Depois que você se foi
Núbia Cavalcanti dos Santos
Sanharó - PE




Depois que você se foi
Meu coração virou um deserto
Meus dias...
Já não os sinto passarem
Minha vida...
Já não tem mais sentido
E sinto-me como se fosse:
Uma ave que perdeu seu ninho
Uma rosa que não desabrochou
Uma noite sem luar...
Depois que você se foi.

Depois que você se foi
Nada mais me importa
Sinto que minha alma
Meu corpo abandonou
E agora, está morta
Porque não suportou a saudade
Que no meu peito, se alojou
Esmagando o meu coração
Que de dor, está sangrando
E de amor, está clamando
Depois que você se foi.




Imagem: google.imagem



terça-feira, 15 de maio de 2012

PEDAÇOS


Pedaços 

Luiza De Marillac Bessa Luna Michel 





Agrupamento do sentir 
Atribuído à solidão 
Catalogadas vozes 
Na odisséia do ser 



Um diário em elos 
Sob revelações 
Paraíso de ascetas 
Ilusões das ilusões 



Férias de sensações 
Confissões impacientes 
Dos sonhos imperiais 



Clarins e princesas 
Retomados são trechos 
Enigmas da Deusa Lua... 



Cônsul dos Poetas Brasileiros - São Paulo Capital

segunda-feira, 14 de maio de 2012

PIEDADE, MINHA MÃE!


PIEDADE, MINHA MÃE!

PIEDADE, MINHA MÃE!
Aparecido Donizetti Hernandez
11-maio- 2012 – 11h56



Sabes que lhe amo, estamos sempre em contradições!
Muitas vezes não a compreendo,
tu muito menos compreendes meus desígnios.
Cada qual vem a essa vida
pra cumprir uma tarefa uma missão.

Nem todos as cumprem, apegam-se a bens materiais.
Apego que não lhe ajudam a evoluir e não contribuem para
a evolução Humana.
Todos sofrem nesse frágil corpo!
Corpo perfeito feito para funcionar sem dores,
Com prazo de validade nesse tempo de sofrimentos.

O Senhor nos deu o livre arbítrio, nos colocou em vossos braços.
Vivo chegamos, não devíamos estar em vossos braços
em um corpo sem vida, com hematomas e feridas.
Cada qual com seus desígnios, em vossos braços com vida,
Juntos na eternidade estaremos nas muitas moradas do nosso Senhor.

domingo, 29 de abril de 2012

MOÇAMBIQUE EM VERSOS


Moçambique em versos


Editora da UFMG lança coleção com os principais poetas de Moçambique; os três primeiros volumes trazem José Craveirinha, Rui Knopfli e Luís Carlos Patraquim

Por Henrique Marques-Samyn ((*)



Os três autores são alguns dos nomes mais representativos da poesia moçambicana de expressão portuguesa, que conta ainda com nomes como Rui de Noronha (1909-1943), considerado precursor; Noémia de Sousa (1926-2003) e Eduardo White (1963), entre outros. Dirigida por Ana Mafalda Leite, a coleção Poetas de Moçambique pretende apresentar ao público brasileiro a moderna poesia moçambicana

Em tempos de guerra, a poesia, mais que possível, é necessária. Que tematize o próprio conflito não é algo essencial; fundamental é que trate do assunto fulcral da literatura de todos os tempos: a experiência humana, assim resgatando os sentidos solapados pela força das armas.
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A Catulo não interessava a guerra civil, mas aquela que cinde o homem enamorado; embora na obra de Dante haja referências aos conflitos que dividiam Florença, associá-la unicamente a isso encerraria um imperdoável reducionismo; e, se Camões figurou a si mesmo portando a espada em uma das mãos e, na outra, a pena, o que esta registrava podiam ser tanto feitos bélicos (como em tantas passagens d’Os Lusíadas, porventura espelhados em suas próprias vivências) quanto o lirismo amoroso dos sonetos.

Em 25 de setembro de 1964, tinha início (nos registros oficiais, ao menos) a Guerra da Independência de Moçambique — mesmo ano em que José Craveirinha publicava Xigubo, seu primeiro poemário; não obstante, já na década de 1950 a resistência se havia organizado em grupos orientados por ideais nacionalistas — decênio em cujo ano derradeiro estreava literariamente Rui Knopfli, com O país dos outros. Se muito insinuam já os títulos das obras (Xigubo é uma dança tradicional que veio a representar a resistência colonial moçambicana), os poemas que delas constam não frustram essas expectativas. 

Knopfli e Craveirinha nasceram literariamente como cronistas poéticos de uma nação apenas sonhada, cuja construção suas trajetórias líricas acompanharam, indagando insistentemente sobre sua identidade. Dessa tarefa participaria também Luís Carlos Patraquim, cujo poemário de estréia, Monção (1980), renovaria esteticamente a literatura moçambicana sem recusar a dimensão política da palavra poética.

A esses três autores são dedicados os primeiros volumes da coleção Poetas de Moçambique, série publicada pela editora UFMG e dirigida por Ana Mafalda Leite, professora na Universidade de Lisboa que viveu a infância e parte da juventude em Moçambique, chegando a iniciar estudos universitários em Maputo. Ana Mafalda conhece de perto as literaturas africanas: lecionou em diversos países do continente (Cabo Verde e Senegal, entre outros, inclusive Moçambique); é autora de estudos fundamentais sobre o assunto — A poética de José Craveirinha (1990), Modalização épica nas literaturas africanas (1996) e Oralidades & escritas nas literaturas africanas (1998) são alguns dos títulos que constam de sua produção bibliográfica, recentemente complementada com Literaturas africanas e formulações pós-coloniais (2003).

Valioso adendo para essa trajetória é o fato de Ana Mafalda ser também escritora, autora de uma obra poética que não se esquiva à tarefa de reelaborar as vivências moçambicanas; trata-se, portanto, de alguém que conhece a literatura em suas múltiplas dimensões como poucos apta a eleger os nomes certos para colaborar nessa empreitada editorial. Com efeito, os responsáveis pelos volumes que abrem a coleção elaboraram obras de valor impecável. 

José Craveirinha

À própria Ana Mafalda Leite coube a organização do volume dedicado a José Craveirinha. Nascido em 1922, falecido em 2003, Craveirinha publicou cinco livros em vida; sua obra é constituída também por volumes póstumos, poemas dispersos e por um numeroso espólio que permanece inédito. O já mencionado Xigubo(1964), obra com a qual estreou o poeta e que abre a compilação, é adequadamente qualificado como uma “rapsódia anticolonialista” por Emílio Maciel, autor da biobibliografia inclusa no volume.

“Xibugo estremece terra do mato
e negros fundem-se ao sopro da xipalapala
e negrinhos de peitos nus na sua cadência levantam os braços para o lume da irmã Lua
e dançam as danças do tempo da guerra
das velhas tribos na margem do rio”, 
escreve o poeta, na lírica imagem sintetizando o ímpeto que percorre toda a obra: a síntese de uma pluralidade de vozes e identidades que se reconhecem como pertencentes a uma nação por haver. 


“Vim de qualquer parte
de uma nação que ainda não existe”,

afirmam os primeiros versos de Poema do futuro cidadão. Poesia panfletária, diriam alguns; a poesia possível, diriam outros, estes mais cientes da missão a que se dedicava, na hora de urgência, um poeta que, nas últimas obras, construiria textos de impecável lirismo. 

As modulações da obra de Craveirinha talvez possam ser qualificadas como as múltiplas vozes de um homem que jamais se fechou ao mundo. O discurso dilatado de Xigubo representa a primeira irrupção de uma fala há muito silenciada — e que não expressa a vontade de um, mas a de muitos homens, ainda soantes emKaringana ua Karingana (1974). Depois do grito, o silêncio: a contenção lírica do poeta que cantou o futuro, mas que percebe um presente feito de perdas. A maior delas: Maria, a esposa falecida em 1979, cujo nome intitula o pungente livro em que lemos um poema como Memória dos dois 

“Ambos
juntos na mesma memória.
Eu
o Zé que não te esquece.
Tu
a Maria sempre lembrada”. 


O tom afirmativo dos primeiros livros cede espaço a uma poética de indagações, enquanto variações da escrita de um poeta que permanece fiel a si mesmo.
“Cada homem é sofisma
Bem engendrado”, 


afirma um dos Poemas eróticos (2004), derradeiras páginas de uma obra que jamais recusou cantar o homem em sua grandeza e em sua miséria, em seu amor e em seus vícios — e que, por isso mesmo, acolhe em si as contradições da condição humana.

Rui Knopfli

Rui Knopfli, dez anos mais jovem que Craveirinha, morreu mais cedo, em 1997. Deixou oito livros, todos representados na coletânea organizada por Eugénio Lisboa, que nela incluiu um posfácio assinado por Roberto Said.

Juízos apressados não tardaram a ver em Knopfli uma espécie de antípoda de Craveirinha. Filho da burguesia, descendente de suíços e portugueses, estreava com um livro em cujo título — O país dos outros (1959) — não seria difícil sentir uma provocação, agudizada pelos poemas que o compunham: onde os cânticos de guerra, os discursos inflamados, a convocação aos heróis? Em vez disso, Knopfli apresentava uma poesia de tom reflexivo, composta com impecável rigor formal, que dialogava explicitamente com a tradição literária ocidental. Injustas, no entanto, as acusações de que o poeta voltava as costas para Moçambique; a par dos diálogos com Fernando Pessoa e Manuel Bandeira, Rui Knopfli publicava poemas de teor francamente político. Leia-se A melhor das distracções, que encena a fala de um grão-senhor 

“marajá, bey, khan,
um nababo qualquer desses com poderes
de Vida e Morte” 


que, sem pudor, afirma: 

“Afastei enfadado
as inomináveis iguarias que me foram servidas
e nem sequer me dignei
olhar as dezasseis virgens sortidas,
fruto do último saque.
Onde me diverti a valer,
foi com as línguas que mandei cortar”.

Leia-se Casamento de conveniência, em que assoma a crítica
aos costumes: 


“Meus pais não querem que ame
a quem amo.
Pretendem que me case contigo,
Juventina.
[...]
Dão-me um automóvel e uma casa
pra que case contigo,
Juventina.
Tens um nome que te quadra à figura,
rapariga,
e trazes intacto o selo necessário.
[...]
Aceitarás com submissão
que te mande à merda de quando em vez
e não farás muitas ondas.
Sei que não pedes mais,
É pegar ou largar,
Juventina!”. 

Visitando a tradição literária, porque sempre falou de si, Rui Knopfli sempre falou de Moçambique, embora nele tantas vezes a nação não se reconhecesse. Ressalte-se que, da obra de estréia ao derradeiro O monhé das cobras (1997), seus livros mantêm uma elevadíssima qualidade estética; não há altos e baixos, mas irrupções que se podem igualar às grandes obras da poesia de todos os tempos — como o magistral O deserto, deMangas verdes com sal (1969), poema que sintetiza, com singular força lírica, os perenes questionamentos existenciais humanos.

Luís Carlos Patraquim

A obra fundacional de Craveirinha e Knopfli tem prosseguimento com a poética renovadora de Luís Carlos Patraquim (nascido em 1953), cuja obra foi antologiada para a coleção por Carmen Lucia Tindó Secco. Como Craveirinha, Patraquim se debruça sobre a terra e as tradições moçambicanas; como Knopfli, engendra um diálogo franco com múltiplas vozes da literatura ocidental. Não obstante, sua obra não se reduz à assimilação dos que o precederam: Patraquim não se esquiva à tarefa primordial do poeta, que é desvelar para o lirismo novas sendas. No posfácio ao volume, observa Cíntia Machado de Campos Almeida tratar-se de uma poesia construída em torno de uma tríade temática: “a memória, o erotismo e a reflexão metapoética”; percebe-se, assim, como a trajetória inaugurada por Monção (1980) já dispensa o dever de poetizar a terra, em vez disso assumindo como pressuposto uma força lírica que é reelaborada pela subjetividade poética para a construção de uma dicção nova.

Notável em sua escrita é, particularmente, a relação com o espaço, ora enquanto referencial geográfico que expande os limites do exercício poético — ressalte-se, a esse respeito, o sentido fundacional de Noções de geografia, espécie de escorço cartográfico do lirismo:

“a sul
implanto uma cartografia sem limites
traço e compasso
depois da madrugada
de ti
um rosto iridescente
alastra o voo claro
das mãos
ao sul
descobrimos
vozes abertas
sem oclusão
e mastigamos água” 

ora enquanto âmbito imagético que enseja a eclosão mesma da poesia; vejam-se as Quatro meditações na margem ao longo do Zambeze, do recente Pneuma (2009), em cuja segunda parte lemos: 

“Senhora, eu não vi os três jacarés
imóveis na margem,
A luz, espelho da carne branca
E a boca metafísica,
Sua canoa vogando o desenho do som
E a elipse das asas;
Vi o rio que rilhava e seus dentes,
O canavial do Tempo,
nodoso e debruçado sobre o impulso líquido
Como o primeiro timbre evolando a cor,
O Sangue do início e a bolsa rompida
Para a convulsão do mundo”.


Não se limitando a falar sobre Moçambique, Patraquim cede a voz à terra: “concebe as paisagens como exímias contadoras de (suas próprias) histórias”, observa Cíntia Almeida. E, esse modo, contribui para a construção de uma tradição poética que, conquanto jovem, já se revela inegavelmente pujante.

(*) Henrique Marques-Samyn é escritor e pesquisador da UERJ

Os livros

José Craveirinha, Antologia poética. Org.: Ana Mafalda Leite, Editora UFMG

Rui Knopfli, Antologia poética. Org.: Eugénio Lisboa, Editora UFMG

Luís Carlos Patraquim, Antologia poética, Org.: Carmen Lucia Tindó Secco, Editora UFMG


Fonte: Rascunho, o jornal de literatura do Brasil, fevereiro de 2012


Fonte: Vermelho